sexta-feira, 23 de abril de 2010

METADE - Oswaldo Montenegro

Que a força do medo que tenho
não me impeça de ver o que anseio.
Que a morte de tudo em que acredito
não me tape os ouvidos e a boca.
Porque metade de mim é o que eu grito
mas a outra metade é silêncio.

Que a música que ouço ao longe
seja linda ainda que tristeza.
Que a mulher que eu amo seja pra sempre amada
mesmo que distante.
Porque metade de mim é partida
mas a outra metade é saudade.

Que as palavras que eu falo não sejam ouvidas como prece
e nem repetidas com fervor.
Apenas respeitadas como a única coisa que resta
a um homem inundado de sentimentos.
Porque metade de mim é o que ouço
mas a outra metade é o que calo.

Que essa minha vontade de ir embora
se transforme na calma e na paz que eu mereço.
Que essa tensão que me corrói por dentro
seja um dia recompensada.
Que o espelho reflita em meu rosto o doce sorriso
que eu me lembro ter dado na infância.
Porque metade de mim é a lembrança do que fui
mas a outra metade eu não sei.

Que não seja preciso mais do que uma simples alegria
pra me fazer aquietar o espírito.
E que o teu silêncio me fale cada vez mais...
Porque metade de mim é abrigo
mas a outra metade é cansaço.

Que a arte nos aponte uma resposta
mesmo que ela não saiba.
E que ninguém a tente complicar
porque é preciso simplicidade pra fazê-la florescer.
Porque metade de mim é a platéia.
A outra metade é a canção.

E que a minha loucura seja perdoada.
Porque metade de mim é amor
E a outra metade também.

Oswaldo Montenegro.

foto Iara do Ivaí


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